Bordar a Vida

Dizem que a mulher minhota tem a alma vestida de mangas arregaçadas. Conceição Pinheiro tem esse espírito e muito mais – o sentido de missão moveu-a durante os anos em que esteve em África e regressada a Portugal, a Vila Verde, casada e com filhos, dedicou-se à valorização da mulher minhota. Foi nessa altura que descobriu a poesia da alma minhota bordada nos Lenços dos Namorados.

Conceição arregaçou mais uma vez as mangas e ajudou a fundar a Aliança Artesanal, uma instituição que recuperou a tradição do Lenço, ajudando a dinamizar o trabalho das bordadeiras do Minho. Segundo a tradição, a rapariga casadoira bordava um pano quadrado de linho fino ou de algodão, lenço que oferecia depois ao seu apaixonado, dando sinais do seu afeto e sentimentos. Os Lenços dos Namorados tornaram-se assim um testemunho de vida e da cultura popular, e um talismã para Conceição.

“O meu marido depois de casarmos, ao fazer 1 ano de casado, recebeu de Portugal um lenço que ele tinha mandado fazer quando nós cá estávamos. Depois quando regressámos novamente para África, ofereceu-me o lenço e deu-me uma “Starmix”, uma máquina de fazer bolos. Eu não gostei muito, tenho de confessar, mas quando ele me apresenta logo de seguida o lenço, pronto a Conceição esqueceu-se da “Starmix”. Guardei-o e para mim foi o talismã para eu me apaixonar e dedicar-me, e olhar para as mulheres e ver tudo isso. Porque os lenços para mim são feitos com alma… A mulher pode não saber bordar, a mulher pode não saber ler nem escrever, como muitos lenços provam isso, mas ela deixa naquele pano, naquele lenço, a sua alma, o seu saber, a sua vida.”

Aos 83 anos, borda o que diz ser o seu último lenço, um de sete lenços que contam a sua vida, um testemunho e uma herança que faz questão de deixar aos vindouros.

As “Rabanadas da Mãe” é uma receita de festa, da época do Natal, que partilha pela primeira vez fora da família. A receita é o resultado de uma adaptação para fintar os diabetes, uma herança genética de que Conceição não se livrou. Leva menos açúcar e mais mel. O toque especial deverá ser dado na segunda calda – um copo de licor de Ginja, não vão as Rabanadas ficar pouco doces!

“Tenho um prazer especial em fazer estas Rabanadas, porque para além de se tratar de uma receita de família, são uma agregação – vêm todos cá a casa comer as Rabanadas da Tia Maria. Daí significarem para mim não só a saudade duma casa que festejava o Natal com um ar muito religioso mas também muito docinho.”

 

Fotografias de Manuel Gomes da Costa

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