O prazer da gastronomia acontece, grande parte das vezes, à mesa, e por isso esta torna-se um elemento essencial na forma como fruímos uma refeição, na sociabilidade entre comensais, na evolução de tradições e rituais, entre outros aspectos. E por isso surgiu o projecto Diaita (antiga palavra grega da qual deriva dieta). A sua investigação passa por estudar a “temática fundamental de um património e identidade culturais comuns a portugueses e brasileiros: a história e a cultura da alimentação.” Um estudo que faz ponte entre Portugal e o Brasil e acolhe investigadores nacionais e brasileiros.
Partindo do tema “A Mesa e as Artes” no primeiro encontro “Colóquios da Primavera”, que aconteceu no Palácio Nacional da Ajuda, falou-se de aparatos e menus de mesas aristocráticas e burguesas, da Idade Média à actualidade.
Neste encontro em que o À Mesa Portuguesa esteve presente – porque também somos um ponto de encontro para quem gosta das arts de la table – abordaram-se temas tão diversos como artes da mesa, produtos, livros, porcelanas e decoração.
Ora aqui fica um tira-gosto, vulgo aperitivo no Brasil, do que ouvimos, para abrir a curiosidade e apetites do género.
Toalha longa e baixela reluzente: a mesa aristocrática medieval
“A mesa aristocrática de recepções e banquetes, um tempo e um espaço de convivialidade e sociabilidade, de cerimonial e aparato, de ética e etiqueta – a forma como a mesa se apresentava aos convidados nas suas toalhas e baixela, demonstrando o brilho e requinte da mesa aristocrática em tempos medievais.”
Quando a “mesa posta” demonstrava o poder e a magnificência – baixela, a toalha, a luz e ornamentação – todo um aparato que simbolizava o poder, riqueza e liberalidades do senhor da casa. Bens que tanto serviam como forma de entesouramento (dado o seu valor, em caso de necessidade podiam ser vendidos) como de propaganda de uma casa/senhor.
Vestir a mesa: séc. XV a XX
“Os têxteis de mesa foram sempre considerados valiosos. (…) Falar nos têxteis de mesa é falar numa diversidade de elementos que acompanham todo o cerimonial da refeição, de que se salientam os panos de cobrir a mesa, as toalhas de mesa, os panos de bufete, os guardanapos e as toalhas de mão. Embora alguns destes elementos tenham mantido uma tipologia semelhante ao longo dos séculos, as suas dimensões, materiais, formas de adorno e modos de uso e colocação foram-se alterando progressivamente.”
Sabia que foi na Renascença que se generalizou o uso do guardanapo? Era então usado ao pescoço. Posteriormente, no séc. XVIII, o guardanapo começa a ser usado sobre o joelho. É da palavra francesa garde-nappe que deriva “guardanapo” – originariamente tratava-se de um tecido utilizado debaixo do prato para proteger, manter (garder) a toalha (nappe), evitando que os convidados usassem a própria toalha. Só no final do séc. XVIII é que começa a haver a noção de conjunto dos têxteis usados na mesa, para o séc. XIX tornar-se o século de ouro dos enxovais elaborados pelas meninas da casa que bordavam posteriormente o monograma. Só depois de conhecerem o noivo bordavam a inicial do seu nome. Se até então o branco era a cor privilegiada à mesa, é no séc. XX que as toalhas começam a apresentar cor.
As salas de jantar da Casa Real na 2ª metade do séc. XIX
“Foi no séc. XIX que a Sala de Jantar se consolida e afirma como divisão entre os espaços habitacionais, afirmação que trouxe a exigência da criação de mobiliário adequado e que acompanhasse a introdução e evolução dos novos rituais do Serviço de Mesa e suas Artes. A Sala de jantar ganha uma nova escala – mais humanizada e ergonómica – e chama a si um carácter mais funcional e utilitário.”
A Sala de Jantar do Palácio da Ajuda, de estilo Neo-renascença, revela o gosto pessoal da Rainha D. Maria Pia. Conhecida por Sala de Jantar da Rainha, data de 1886 – era esta a sala de jantar usada diariamente, com um cariz familiar.
E já agora, a quem importa, vale a pena ficar atento ao projecto Diaita – Património Alimentar da Lusofonia, aos seus estudos e publicações.